segunda-feira, 2 de setembro de 2019



Suicídio, morte e alma


Quando nascemos, não temos idade suficiente para morrer mas, à medida em que crescemos, já estamos morrendo. A morte é nossa única certeza e este é o ciclo “natural” dos seres vivos. Entretanto, quando nos aproximamos da psique, da alma de uma pessoa, percebemos que não é tão simples assim. A morte e o suicídio são temas discutidos desde tempos antigos pelos filósofos, pela sociedade e pelas religiões.  

Há maior probabilidade de suicídio no lar do que num hospício. Pessoas famosas, amigos, vizinhos ou até nós mesmos. Este tema pode aparecer dentro do curso normal em qualquer vida e vem atrelado à vergonha: a lei considera crime, a religião pecado e a sociedade vira as costas. Tudo isso acaba fazendo com que a responsabilidade seja do próprio indivíduo. 


        Na sociologia, na medicina e na sociedade, o suicídio é visto como um problema de fora, sendo classificado, quantificado, generalizado. Pode ser um problema coletivo, um afrouxamento social, enfraquecimento de laços sociais, falta de Deus, clima, hereditariedade e diversas explicações científicas tem sido dadas pela maioria das ciências, criando teorias de prevenção em favor da vida.

Mas.. e a morte, quem olha?  A fantasia, as ideações, o devaneio, o indivíduo e sua alma.. quem olha? A ideia do suicídio vem carregado de significado e, nós, Psicólogos, perguntamo-nos que tragédia pessoal o faz escolher a morte. 

Os problemas não são classificáveis ou categorias médicas e sim, acima de tudo, experiências, sofrimentos e dores. O lado de fora é classificável, mas o lado de dentro é vivenciado, experienciado e cheio de significado. Nossa alma é cheia de imprecisões e complexidades, e cada um é um universo infinito e particular ao mesmo tempo que possui conteúdos coletivos, culturais. Acontece que, generalizar uma dor e quantificar o suicídio já é uma violência em si contra o ser humano.

Do ponto de vista sociológico, médico e teológico o suicídio pode ser prevenido, porém, antes de conhecer a alma que está por trás deste ou daquele sofrimento, não conseguirá. O Psicólogo é o único capacitado a  trazer o suicídio para perto e vivenciá-lo tal como seu paciente, chegando onde o suicídio faz sentido. 



O médico Psiquiatra não está apto a realizar este trabalho. Ele  de fora, seu único comprometimento é com a vida. Lhe prescreverá medicamentos para afastar a morte e a dor de viver.

O Psicólogo está comprometido com a alma daquele que o procura, ele conseguirá estar, ao mesmo tempo, dentro e fora, experienciando e observando. É o único profissional que dará atenção também e principalmente à morte, sabendo que ela não está sendo experienciada pelo ser e, por isso, vem à tona através de emoções, sentimentos e fantasias suicidas.

Vivemos para morrer. A vida só adquire valor porque está atrelada à morte, pois, é uma condição existencial: a condição de que a vida só tem sentido pela certeza da morte e, se não há sentido em viver, a morte pode parecer ser melhor escolha. 

Na Psicologia vida e morte podem ser experienciadas juntas: a morte pode ser experienciada durante a vida: simbolicamente através de fantasias, sonhos, nos sintomas de ansiedade aguda, nas experiências de quase morte, nas visões e, qualquer ato que afaste a morte, impede a vida. 






Referência: HILMANN, James. Suicídio e Alma. Tradução: Sônia Maria Caiuby Labate, Petrópolis, RJ; Vozes, 1993.

2 comentários:

  1. Pouquíssimas pessoas conseguem entrar nesse mundo tão dolorido. Belas palavras!

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    1. É por ser tão dolorido que estamos lá para dividir a dor junto com o paciente. Assim, ela se torna menor. Obrigada.

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