terça-feira, 13 de agosto de 2019



Segredos e Inconsciente


O segredo pode ser muito destrutivo quando é estritamente pessoal, pois ele segrega seu portador do convívio com os demais, tanto mais quando ele é oculto de nós mesmos.

            E como algo pode ser ocultado de nós mesmos?

            Durante o dia temos diversos pensamentos e fantasias que associamos com os acontecimentos, porém, alguns pensamentos nos parecem tão absurdos que logo tratamos de ignorá-los. Essas fantasias não desaparecem simplesmente da nossa mente, então, para onde elas vão? Elas são enviadas para o nosso inconsciente – lá, nós não pensamos nelas. Mas essas fantasias não deixam de existir e, quando dormimos, abrimos as portas do inconsciente e elas fluem livremente através dos nossos sonhos. Quando sonhamos, elas tomam formas, imagens e proporções simbólicas que misturam-se com conteúdos próprios e arcaicos de nossas profundezas que muitas vezes não entendemos ou nos parecem tão absurdos e sem sentido.

                                                                               

Mas os conteúdos do nosso inconsciente não são somente pensamentos ou fantasias que passaram pela consciência e ignoramos. Nosso inconsciente também possui conteúdos próprios, que surgem de regiões desconhecidas e se desenvolvem, pouco a pouco, para a consciência e, de qualquer forma, todos costumam ter alguma efeito sobre ela. 

Que efeitos são esses?

            São efeitos indiretos, ou seja, não aparecem da mesma forma com que foram pensados. São pequenas interferências – chamamos de sintomas neuróticos. Você já se viu esquecendo algum nome importante, trocando as palavras ou mesmo tendo movimentos desastrados, enganos sobre memórias ou até mesmo alucinações ou mesmo atitudes das quais você não queria ter? Pois é, essas são interferências dos conteúdos do seu inconsciente.

            Mas não temos somente o segredo, pensamentos e fantasias ocultas, temos também outra forma de ocultar: conter. Geralmente o que é contido é o afeto – aquilo que nos afeta.

            Muitas vezes a contenção é algo útil e benéfico. A autodisciplina é uma arte antiga, desde os povos primitivos quando estes realizavam rituais de iniciação para suportarem o medo  e a dor. No entanto, neste caso, a contenção ocorria de forma coletiva e, atualmente, se a contenção for exclusivamente pessoal, torna-se tão destrutiva quanto um segredo e isso também pode ser ocultado de nós mesmos.

Um exemplo de contenção é quando amo alguém, mas, por medo de sofrer alguma dor, eu contenho este amor e o escondo, racionalizo, dizendo para mim mesma que não o amo, procurando defeitos ou algo que me faça desistir.

            Outro exemplo de contenção é uma mulher que tem uma gravidez indesejada (ou mesmo desejada) e em algum momento ela pensa que não seria uma boa hora ter um filho, ou que não deveria ter feito isso, mas rejeitar um filho lhe parece tão absurdo e moralmente inaceitável que ela contém este afeto.                                                                             



            E para onde vão estes afetos contidos? Para o mesmo lugar das fantasias e devaneios que achamos tolos ou absurdos: o inconsciente. Lá, tudo isso mistura-se com conteúdos próprios que já estão lá e tomam formas e simbologias próprias, é como se formasse outra personalidade de nós mesmos – a isso damos o nome de complexos - respingando em comportamentos posteriores que nos causam sofrimento e geralmente não sabemos o porquê.

            Através da exposição dos segredos e do esclarecimento de nossas partes obscuras na psicoterapia, eles são postos, aos poucos, à luz da consciência e, assim, muitas vezes descobrimos as causas de muitos comportamentos e atitudes que nos trazem sofrimento e que antes nos pareciam estranhos e sem explicação. Parece muito fácil, mas, dependendo do grau de aceitação do paciente, é muito comum, ainda assim, resistir,  justificando por diversas vias da racionalização suas atitudes para continuar tendo-as. 

                                                                               

            Muitas pessoas desistem da psicoterapia antes mesmo de enfrentar suas dores, suas obscuridades, fazendo todo o tipo de racionalização para justificarem seus comportamentos autodestrutivos. Atualmente, a questão mais comum é a falta de dinheiro. Não que isso não aconteça, de fato vivemos em uma situação econômica bem complicada, porém, aquilo que os levou à procurar o Psicólogo de repente já não é mais tão importante.

Jung tem uma frase que diz: “Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim por tornar consciente a escuridão.”

Então, parece simples né? Confessamos tudo ao Psicoterapeuta, dando a sensação de que tudo foi jogado para fora, conhecemos nossos aspectos mais sombrios, sabemos o que provoca nossas neuroses e pronto, estamos curados? Muitas pessoas também desistem da psicoterapia neste ponto, achando que estão curados e que valeu a pena o dinheiro gasto. Porém, não é bem assim que funciona..

            Essa sensação é ilusória, pois, esta é uma racionalização e justificativa para continuar tendo as mesmas atitudes que vão continuar lhe trazendo sofrimento, pois, só saber o que as causa não quer dizer que você esteja de “alta”.. 

Não desista, o caminho pode parecer difícil, mas seu Psicoterapeuta estará ao seu lado, de mãos dadas com você! 






Referência: JUNG, C.G. A prática da Psicoterapia. Cap. V, p. 54 - 60, 1971. 


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